quinta-feira, 17 de julho de 2014

Desregramento institucional

Folha de S. Paulo, 17 de julho de 2014.

Janio de Freitas

Longe da democracia

Deputados e senadores não podem conceder-se faltas remuneradas fora dos casos admitidos em normas legais
A maneira de usurpar dos brasileiros o direito de contar com um Congresso era o golpe militar, cuja repetição persistente, por um século, o fez parecer a razão de existir do Exército. Nos últimos 25 anos, ou mais ou menos desde a eleição de Collor, as sucessivas composições da Câmara e do Senado têm afastado cada vez mais essas Casas da sua função institucional, com o crescente desregramento interno e o descompromisso sempre maior com as expectativas do país, redemocratizado, em relação ao seu Legislativo.
Estamos a cada dia mais próximos de poder perguntar-nos: o Brasil ainda tem Congresso composto de Câmara e Senado?
Os artifícios para mascarar o recesso que deputados e senadores se dão a partir de hoje, e até as eleições, não mudam a realidade: com a dispensa de comparecimento sem haverem votado, no prazo estabelecido pela Constituição, as diretrizes do Orçamento nacional para o próximo ano, fica instaurada uma situação de ilegalidade. Criada por um dos Três Poderes, é uma situação de anormalidade institucional.
A Constituição e os Regimentos Internos da Câmara e do Senado não foram alterados. Logo, deputados e senadores não podem conceder-se ausências remuneradas fora dos casos admitidos pelas normas vigentes, fixadas pelas próprias Casas. O pagamento e o recebimento das ausências fora das normas, nos 80 dias daqui às eleições, apesar de já programados, não serão legais.
Não é a primeira vez que Câmara e Senado deixam de cumprir o prazo limite, que recai no início das férias de meio do ano, para votar a Lei de Diretrizes Orçamentárias. Assim foi, por exemplo, no ano passado, com o adiamento da votação para o retorno das férias, no começo de agosto. Neste ano, a transgressão se agrava no prazo, no cancelamento das sessões plenárias já marcadas na Câmara, e na autorização tácita para a ausência sistemática e remunerada fora das férias. A rigor, e a despeito dos mascaramentos em uma ou outra comissão ou discussão, o Congresso fica suspenso.
Diz-se que o Brasil vai eleger, em outubro, deputados e senadores. Não é uma afirmação precisa.

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